Com surto crescendo, autoridades de saúde fecham cerco à febre amarela

Publicado por Tv Minas em 16/01/2019 às 21h54

Fonte: G1

Matéria extraída do G1

 

Letalidade da doença, acima de 50% em números de casos confirmados, reforça necessidade de vacinação, diz superintendente em Pouso Alegre.

 

Sul de Minas vive um surto de febre amarela sem precedentes. Até agora, oficialmente, já foram confirmados pela Secretaria de Estado de Saúde 24 casos da doença na região, com 11 mortes. Pelo menos nove desses casos foram confirmados na área de abrangência da Superintendência Regional de Saúde de Pouso Alegre, que engloba 53 municípios. Segundo o superintendente Luis Augusto de Faria, "apesar de estável, a situação não está totalmente controlada e o controle depende muito mais do cidadão no ato de buscar a vacinação".

 

Para entender os motivos que levaram o Sul de Minas a registrar tantos casos da doença neste ano, o G1 foi até Pouso Alegre conversar com o superintendente regional de saúde. Na entrevista, ele fala sobre os caminhos que o vírus percorreu até chegar à nossa região, como está o combate e o que podemos esperar para o futuro. Confira abaixo os principais pontos:

 

Apenas uma das 11 cidades com casos confirmados de febre amarela cumpriu meta de vacinação no Sul de MG

 

Casos de febre amarela não afetam rotina do turismo em São Tomé das Letras, dizem comerciantes

 

 

Como está a situação hoje

 

Ainda é uma situação preocupante porque nós estamos em um período sazonal, ou seja, o período onde os vetores que são os mosquitos transmissores da doença ainda estão proliferando.

 

Tecnicamente a gente sabe que esses mosquitos tendem a ter uma atuação aumentada principalmente nesse período de chuvas e que geralmente se encerra nos meses de maio, junho, ou seja, ainda temos alguns meses pela frente. Diante disso, nós consideramos que enquanto nós não tivermos acima de 95% de cobertura vacinal, a gente não pode ficar tranquilo, porque enquanto 1%, ou enquanto uma pessoa não estiver vacinada, essa pessoa pode ser vítima da febre amarela, que é uma doença de alta letalidade.

 

As estatísticas da nossa região têm registrado grande número de mortes em relação aos casos confirmados.

 

 

Segundo superintendente de Saúde de Pouso Alegre, situação não está totalmente controlada.

 

 

Por que temos mais casos na região de Pouso Alegre

 

Hoje nós temos nove casos confirmados na regional de Pouso Alegre. Desses, seis foram a óbito. Isso significa uma alta letalidade dos casos confirmados, uma letalidade que demonstra que dos nossos casos suspeitos, grande parte foram casos graves e os casos graves têm uma letalidade que supera 50% inclusive pela literatura.

 

No estado está em torno de 33% porque você acaba englobando os casos leves que são confirmados, mas não evoluem para óbito. O fato da nossa região nunca ter tido uma casuística tão alta, um surto de febre amarela como está tendo este ano, acabou levando a gente para um cenário onde os casos leves muitas vezes podem estar sendo subnotificados.

 

Os casos graves, como são muito evidentes, eles entram num protocolo de notificação, os médicos e as equipes que atendem esse paciente suspeitam e notificam. Os casos leves podem ser confundidos com outras doenças. Uma explicação possível, mas não confirmada, é de que os casos leves estão sendo eventualmente subnotificados, ou seja, não estão sendo suspeitados da maneira como outras regiões que já têm histórico de surto em 2017 estão notificando.

 

A nossa região, vamos dizer assim, está ainda aprendendo a lidar com esse tipo de doença, uma vez que até ano passado nós não tínhamos tido nenhum caso em humanos.

 

 

Casos confirmados em macacos significam que o vírus está na região?

 

Exatamente, o fato de termos epizootias, macacos mortos para febre amarela, significa de fato que nós temos o vírus circulante. Na verdade, como a febre amarela que hoje acomete nosso país e estado é da forma silvestre, nós sabemos que esses vírus têm circulado nas regiões de mata, regiões silvestres e eles acabam acometendo o ser humano de forma acidental.

 

É aquele indivíduo que trabalha na zona rural, próximo à região de matas, ou que adentra a mata por algum motivo, seja ele por motivo de trabalho ou lazer, geralmente numa faixa etária bem característica ou num perfil epidemiológico bem característico, que é aquele indivíduo do sexo masculino na casa de 40 a 45 anos, que é o indivíduo que adentra nesse local principalmente a trabalho.

 

E por que homem? Geralmente a gente tem estatísticas que comprovam que o homem, principalmente com esse perfil epidemiológico, trabalhador de zona rural, é aquele que menos se cuida, é aquele que menos procura unidades de saúde seja para uma consulta de rotina, seja para uma situação de vacinação.

 

Então nós estamos nos deparando com um público, um cidadão com esse tipo de perfil, que nunca se vacinou e muitas vezes se deparando com situações onde ele não se vacinou não só para febre amarela, como outras doenças também, como tétano, outras doenças passíveis de vacinação.

 

 

Segundo superintendente, controle da febre amarela depende mais da população procurar a vacina.

 

 

Mosquito pica quem invade seu ecossistema

 

Não é que o mosquito escolhe, na verdade o mosquito acaba picando quem adentra esse ecossistema, vamos dizer assim, que é o habitat dos mosquitos transmissores da febre amarela. São dois gêneros, tipos que vivem essencialmente em matas.

 

Mosquitos que essencialmente ficam na copa das árvores, mas que podem descer, inclusive procurando alimento, que pode estar no primata ou no ser humano que adentrou a mata. Não podemos esquecer que, inclusive, estudos entomológicos e do ponto de vista de ecologia desse tipo de animal demonstram que o Haemagogous, por exemplo, pode sobrevoar distâncias longas, de até 6 km da mata onde ele está.

 

É um mosquito que a gente diria que é fronteiriço, numa situação especial, seja de desequilíbrio de ecossistema e na busca do alimento ele pode sobrevoar até 6 km e procurar no ser humano a sua fonte de alimento.

 

Esse é o motivo, inclusive, que a gente reforça a importância de forma alguma matar macacos e primatas não humanos porque eles são, além do meio de alimentação natural desse tipo de mosquito, que é silvestre, uma vez morrendo esses macacos, esses mosquitos vão procurar outras fontes de alimento e o ser humano, que é um hospedeiro acidental, pode se transformar em um hospedeiro preferencial na falta do primata.

 

Então é mais um motivo pra que a gente cuide, zele por esses primatas (macacos) e não maltrate de forma alguma, muito menos mate, porque, além de um sinal de alerta, eles contribuem para esse equilíbrio do ecossistema.

 

 

Como a febre amarela veio parar no Sul de Minas

 

Existem várias teses que estão relacionadas à questão da febre amarela, mas o que se sabe é que o vírus sempre circulou em regiões de matas, inclusive ano passado nós já tivemos na nossa região macacos que foram mortos inclusive confirmados para febre amarela, o que comprova que a circulação do vírus na nossa região não é nova.

 

Estudos demonstram que a febre amarela é um vírus cíclico, porque da mesma forma que o ser humano é muito vulnerável ao vírus, os macacos também o são. Então, geralmente, a gente fala de ciclos de cada cinco, sete anos, que é o tempo que você tem muitas vezes uma morte maciça de primatas nas matas.

 

A partir desse período, existe uma renovação desses animais, porque novos animais nascem e os que sobrevivem são animais que muitas vezes entraram em contato com o vírus e não morreram, então naturalmente eles ficaram imunizados. Geralmente em locais endêmicos para febre amarela, a gente vê ciclos de cinco a sete anos.

 

No caso do Sul de Minas, nós estamos muito próximos do Estado de São Paulo, que a gente sabe que teve uma casuística muito alta neste ano e também temos comunicação do ponto de vista de corredores ecológicos com outras áreas que também tiveram febre amarela, inclusive em Minas Gerais no ano passado.

 

O vírus não respeita limite geográfico, o vírus se utiliza dos corredores ecológicos e à medida que ele vai causando a disseminação entre primatas e eles vão morrendo, eles vão buscando onde existe o primata saudável, passível de servir de alimento para essas fêmeas de mosquito.

 

 

Segundo superintendente, letalidade da febre amarela ultrapassa 50% no Sul de Minas.

 

 

Como estará a situação nos próximos meses

 

Hoje nós estamos diante de uma doença extremamente grave, de alta letalidade, mas com uma vantagem em relação às outras doenças porque ela possui um método altamente eficaz, que é a vacina.

 

Hoje nós transformamos nossa região em um exemplo para o resto do estado porque nós categorizamos todos os nossos municípios que não tiveram casos confirmados em humanos e macacos em categoria 2 de intensificação.

 

Além da rotina de vacinação, esses municípios estão buscando casa a casa, principalmente na zona rural, que é a região mais próxima de matas e a mais vulnerável, estão buscando pessoas não vacinadas.

 

Esse bloqueio vacinal é o que vai nos dar tranquilidade daqui pra frente. Então daqui em diante, a gente acredita que ainda teremos casos de febre amarela pela sazonalidade, pelo período que estamos vivendo. Mas a tendência é que à medida que o cidadão e a cidadã se vacinarem, esses casos ficarão restritos, vão se limitando e aqueles que não tiverem vacinado, infelizmente são aqueles que serão acometidos daqui pra frente.

 

A vacinação é o melhor caminho. O risco de um evento adverso é muito baixo diante do risco da doença, que a gente sabe, é muito alto para quem não foi vacinado. E uma vez doente, o risco de morte é muito alto.

 

 

Resistência à vacina

 

Nós trabalhamos na estratégia da sensibilização e da informação. O primeiro ponto que a gente inclusive tem orientado os municípios é tentar entender o porquê da recusa, respeitando o direito do cidadão de decidir pela própria saúde, que é um direito constitucional que não deve ser infringido. Mas de qualquer forma a gente busca entender o porquê pra que a gente possa esclarecer, muitas vezes a gente tem se deparado com situações de recusas deflagradas por desinformação.

 

Às vezes, a pessoa acha que pode ter algum tipo de reação com estatísticas bem fora do que a gente de fato tem na realidade ou às vezes a pessoa acha que tem outros fatores que podem justificar a recusa, de repente até um pré-conceito em relação à vacina da febre amarela e até de outras vacinas.

 

Muitas vezes, quem recusa a vacina da febre amarela já recusou a vacina da gripe e é quem recusou outras vacinas em outros momentos, muitas vezes tem aspectos ai de cunho de informação, cultura, de cunho religioso.

 

 

Surto de febre amarela

 

É fundamental enfatizar que a nossa região vive um surto sem precedentes, que a situação apesar de mais estável, ela não está totalmente controlada e o controle muito mais vai depender do próprio cidadão buscar a oportunidade de vacinação, do que a gente esperar que venha outra ação seja de cunho de governo, município, estado, União, porque a vacinação é o bloqueio mais importante, é a forma mais efetiva da gente bloquear o avanço do surto de febre amarela.

 

Temos feito um trabalho grande com os municípios para tentar conter o surto, mas se o cidadão não estiver consciente e não buscar de fato a vacinação na faixa etária acima dos 9 meses, a gente vai ficar exposto e vulnerável correndo o risco de uma verdadeira epidemia se não fizermos a nossa parte.

 

 

Outras doenças não deixaram de existir

 

O Aedes aegypti é um mosquito essencialmente urbano, ele é o grande transmissor de doenças e foi responsável por grandes surtos como o caso de dengue, chikungunya, zika vírus e é importante que a população tenha consciência que esses vírus continuam circulando. Nós inclusive tivemos casos de dengue e chikungunya no Sul de Minas.

 

Isso significa que, agora, a nossa preocupação claro é em relação à febre amarela por ser uma doença de maior letalidade, que mata mais que as outras, porém nós temos o Aedes aegypti ocupando papel estratégico no combate, tanto da dengue, zika e chikungunya, mas também febre amarela, porque o Aedes pode transformar um problema que hoje é silvestre em um problema urbano.

 

A gente não pode esquecer que o combate aos criadouros tem que continuar. Onde tiver acúmulo de água, é importante que pelo menos semanalmente se faça uma vigilância, uma conferência dos locais. Limpe, renove essa água, elimine qualquer tipo de sujeira que possa fazer essa água ficar represada, porque do momento que o mosquito põe o ovo até ele eclodir, isso leva sete dias.

 

Garantindo a vacinação adequada contra a febre amarela e mantendo o combate ao mosquito Aedes aegypti, nós estaremos prevenindo não só a urbanização da febre amarela, mas quatro doenças extremamente graves, limitantes e fatais que podem acometer nossa população.

 

 

Febre Amarela

 

A febre amarela é uma doença infecciosa febril aguda, causada por um vírus transmitido por mosquitos vetores, e possui dois ciclos de transmissão: silvestre (quando há transmissão em área rural ou de floresta) e urbano. O vírus é transmitido pela picada dos mosquitos transmissores infectados e não há transmissão direta de pessoa a pessoa. Nas cidades é transmitida principalmente por mosquitos da espécie Aedes aegypti.

 

Os sintomas iniciais da febre amarela incluem o início súbito de febre, calafrios, dor de cabeça intensa, dores nas costas, dores no corpo em geral, náuseas e vômitos, fadiga e fraqueza.

 

 

Entenda como ocorre a infecção e quais são os sintomas da febre amarela.

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