Inflação disfarçada tem produtos reduzidos e preços mantidos

Publicado por Tv Minas em 19/09/2021 às 00h45

Fonte: O Tempo

Na prática, o cliente paga o mesmo valor por uma quantidade inferior à que era adquirida.

Como se não bastasse a inflação acumulada de 9,7% no último ano, os produtos também estão diminuindo nas prateleiras de supermercado. As caixas de bombons são um exemplo clássico – elas já pesaram meio quilo e, agora, são metade disso. Mas elas não são o único item que diminuiu de tamanho e permaneceu com o mesmo preço ou ficou ainda mais caro. Molho de tomate, salgadinhos e até paçoquinha, tudo isso diminuiu de tamanho no carrinho, pegando consumidores desavisados de surpresa e gerando revolta em quem percebe a diminuição.

“Acho que isso é uma forma de enganar o consumidor que está acostumado a uma marca e nem presta atenção na mudança. Eu mesma nunca reparei no aviso de alteração na embalagem, a não ser quando pego o produto e acho estranho que esteja menor. A redução parece pouca, mas isso deve alterar muito o faturamento das empresas. Isso devia ser repassado de alguma forma para o consumidor”, pondera a administradora aposentada Íris Reis, 63.

O coordenador do Procon da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Marcelo Barbosa, lembra o caso emblemático do papel higiênico, no começo dos anos 2000, quando empresas diminuíram dezenas de metros dos rolos. “Sempre considerei isso uma publicidade enganosa, porque acaba induzindo o consumidor ao erro. Dizer que o aviso de mudança é ostensivo é muito relativo”, pontua. 

As marcas são obrigadas, por lei, a informar a diminuição, inclusive com a porcentagem reduzida, “de forma ostensiva” na embalagem durante pelo menos três meses, sob risco de multa. A portaria federal de 2002 que estipula essa medida, entretanto, não deixa claro o tamanho que o aviso precisa ocupar no produto. Assim, os alertas de diminuição nas embalagens, muitas vezes discretos, passam despercebidos pelos consumidores mais apressados.

“Eu nem reparo na embalagem. Não é legal para o consumidor, tudo só continua aumentando. Isso tem cara de manobra de inflação”, avalia o funcionário público Benedito da Silva, 52. A manobra tem nomes: “shrinkflation” (“reduflação”, em tradução livre) ou “maquiagem de produto”. Na prática, o consumidor está pagando mais pelo item, como ocorre com a inflação.

No supermercado onde Benedito fazia as compras, por exemplo, uma nova remessa de pacotes de salgadinhos chegou na última semana com quase 8% menos produto do que antes, mas vendida com o mesmo preço, tanto para o mercado quanto para o consumidor. 

 

Venda para mercados também é mais cara, diz gerente

“O primeiro efeito disso é a redução do consumo no supermercado, porque se o cliente percebe que o biscoito de 140g não tem uma diferença tão grande de preço do biscoito de 120g, leva o maior, e eu fico com estoque represado. O produtor diminui a gramatura e aumenta o preço, até para o supermercado. É uma sacanagem o que a indústria está fazendo”, diz o gerente da rede de supermercados Guarim Guarani, César Lima. 

A Associação Mineira de Supermercados (Amis) afirma que as mudanças observadas durante a pandemia não foram maiores do que em períodos anteriores e que as alterações são decididas pelos fabricantes. “O setor supermercadista negocia exaustivamente para que não haja repasse de preços ao consumidor. A AMIS orienta à população sempre a estar atenta e comparar preços”, diz o presidente executivo da associação, Antônio Claret.  

A Lei Estadual 14.689, de 2003, também obriga que informações sobre a mudança sejam afixadas próximo aos produtos no ponto de venda. Caso o consumidor note irregularidades, pode procurar o Procon do Ministério Público de Minas Gerais.

 

NOVOS HÁBITOS DE CONSUMO E EMBALAGEM MAIS CARA

Nem as paçoquinhas escaparam à redução de embalagens. A opção light das Paçoquitas, da empresa Santa Helena, passou de 22 g para 18 g. Segundo a produtora, a diminuição foi necessária devido à alta do preço do amendoim e de inflação de 39% sobre as embalagens. A marca de chocolates Hershey’s também diz que diminuiu suas barras devido ao cenário “da valorização do dólar, aumento de custos logísticos e de matérias-primas e embalagens”.

A diretora executiva da Associação Brasileira de Embalagem (Abre), Luciana Pellegrino, afirma que a oferta de matéria-prima para as embalagens e os preços ainda não foram normalizados, após um impacto significativo nos primeiros meses da pandemia. “Houve escassez e inflação do preço dos materiais, até porque muitos são commodities, com preços do mercado internacional”, pontua.

Ela também reflete que as marcas têm se adaptado ao aumento dos divórcios e à redução do tamanho das famílias brasileiras nas últimas décadas, lançando embalagens menores ou em tamanhos muito maiores, apelando para categorias econômicas. As mudanças de comportamento do consumidor também são apontadas pela Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia).

“As empresas têm desenvolvido produtos com tamanho reduzido, atendendo a uma tendência e demanda mundial dos consumidores”, disse em nota. A Abia destaca ainda que a composição dos preços inclui fatores como a negociação entre fornecedores e pontos de venda.

 

Confira alguns produtos que tiveram o tamanho reduzido nos supermercados*

 

Salgadinhos Ruffles:

De 84g, para 76g. Redução de 9,5%.

 

Sabonete Daily Care Johnson&Johnson

De 90g para 80g. Redução de 11,2%.

 

Molho de tomate Pomarola

De 340g para 320g, Redução de 5,9%.

 

Biscoito Nesfit

De 200g para 160g, Redução de 20%.

 

Barra de chocolate Special Dark Hershey’s

De 100g para 85g, redução de 15%. 

 

ATENÇÃO: As embalagens de ovo também estão menores no mercado. Tradicionalmente vendidas com 30 ou 12 unidades, agora é comum encontrar opções de 20 e 10 unidades. 

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